Filinto Elísio
(1734 – 1819)
“Filinto Elísio é o pseudónimo de Francisco Manuel do Nascimento. A sua origem é extremamente modesta. Cursa o seminário e ordena-se. Já dos seus tempos de estudante lhe vem o enorme interesse por Horácio.
Poeta desde cedo, forma a sua academia, que passou a ser designado pelo Grupo da Ribeira das Naus. Os poetas deste Grupo antagonizavam os da Arcádia Lusitana e, por isso, passaram a ser conhecidos pelo nome de “dissidentes”, e, entre estes, os mais notáveis foram precisamente Filinto Elísio e Nicolau Tolentino.
Filinto é fundamentalmente um discípulo de Horácio e daí a ênfase no rigor da construção, na preponderância da Razão sobre o Sentimento; daqui o vernaculismo, a tentativa de dominar a emoção que começava a perturbar as mentes poéticas sensíveis ao Romantismo que emergia no horizonte.
Foi perseguido pela Inquisição, mas, quando os esbirros do Santo Ofício estavam prestes a lançar-lhe as mãos, ele consegue fugir para França.
A França foi o seu lugar de refúgio, com um interregno de quatro anos na Holanda.
A sua Carta a Francisco José Maria de Brito é uma notabilíssima “ Arte Poética” de inspiração horaciana, onde se nota, também, a influência de António Ferreira.
Nenhum poeta, desde Camões, havia feito tantos serviços à língua portuguesa: só por si, Filinto Elísio valeu uma academia e fez mais do que ela”.
Lembremo-lo, então, com os sonetos que se seguem:
I
A língua portuguesa sorveu
do latim e do grego a precisão;
foi de todos o elo de união,
até que a bruta mente a corrompeu.
A mãos facinorosas ela cedeu:
o enleio godo-árabe, seu bordão,
desfeiou a lusa fala e, então,
durante séculos adormeceu.
Mas reis João Segundo e Manuel
protegeram da língua a elegância,
que foi dos Romanos e agora nossa.
De limos a despiram com cinzel
e aromatizaram-na com fragrância,
que dela jamais alguém fará troça.
II
Abandonem já o torrão natal
os que rejeitam eloquentes sábios
e atafulham, alegres, da boca os lábios
com migalhas estranjas e em caudal.
Na velha Europa há dourado metal:
ilustres bispos que incutem ressábios
em nobres e até em muitos seres não ábios;
damas p’ra quem Musas são um rosal.
Oh! Quem me dera ver a Pátria minha
desejosa de saber como outrora,
quando Camões destruiu as fronteiras
que escondiam as belezas da rainha
do Lácio e o templo onde Apolo mora.
Ora preferem línguas estrangeiras!
III
Quão bela é a língua sem retalhos,
nem bastardias como a portuguesa.
Lucrécio pedia subtileza,
Vénia p’ra latina, sem gasalhos.
A porca modernice e os enxovalhos
lançaram a fala lusa p’ra baixeza.
Imitámos franceses com certeza.
Porém, eles nem todos eram letrados.
Consideras sublime a concisão;
na construção da frase, que rigor!
P’ra ti, Razão domina o Sentimento.
Vernaculismo e novos termos são
tua preocupação e fervor.
Filinto, parabéns ao teu talento.
Agostinho Alves Fardilha (o meu pai)
Coimbra