domingo, janeiro 15, 2012

Momento de poesia com Agostinho Fardilha



Nicolau Tolentino de Almeida

(1740 – 1811)



Do  nosso sec. XVIII a melhor produção em verso é a obra satírica de Nicolau Tolentino de Almeida, no género a mais notável da literatura portuguesa.

Uma parte importante da obra de Tolentino é constituída por memoriais e requerimentos em verso, assim como por poesias de humilde homenagem aos grandes de quem dependia. Mais que uma sátira,a obra de Tolentino é uma ironia impassível,envolvendo o próprio autor que se vê também ironicamente a si mesmo.

 O mais profundo efeito estético que resulta dos seus versos provém de um superior manejo da ironia”.



Recordemo-lo com os sonetos, quartetos e quintilhas que se seguem.

Obs. Respeitei a estrutura ritmíca das composições do Poeta




Sonetos
A – Solução para a crise
Sou pastor e soletro devagar.
Já faço contas a diminuir.
A escrita ainda me faz sorrir.
Mas em breve tudo isto vai mudar:

meus conhecimentos vou apurar.
Farei manada e rebanho a mim vir
e direi que, p’ra termos bons porvir,
comer e beber, mas não esbanjar.

Todos os excrementos deverão ser
aproveitados para no futuro
no país nunca recessão haver.

Enquanto estudo, vós ireis no duro
trabalhar, p’ra comida merecer.
O contrário, estareis em apuro.
                 

B – continuação

Senhor Primeiro Ministro, queria
ser a rendoso cargo pretendente,
porque me considero competente
p’ra ocupar lugar de muita valia.

Possuo cultura e sabedoria.
Prometo em tudo ser-lhe obediente.
Minhas entrevistas, passadas a pente
fino, deixam o povo em agonia.

Bons conselhos e avisos a todos dei.
Farei recuperar as esperanças
nas contas públicas dentro da lei.

Pretendo ser Ministro das Finanças,
seguindo o que até aos brutos ensinei:
poupar, trabalhar e muitas cobranças!


Quartetos
A uma quarentona pretensiosa




És esquelética e de ti beleza
fugiu. O toucado parece ninho
de cegonha. Aí pões adornos teus,
p’ra agradar ao velho e gordo amiguinho.

Lá guardas cabeleira com madeixas,
encobrindo a careca encarquilhada;
p’ro namorado ter onde apalpar,
p’ras ancas escondes postiça camada.


Quintetos


A um peralta corcunda e perneta





Por que queres alterar a obra de Deus?
Por que passar desejas por casquilho?
Jamais na mulhar verás peitos seus,
porque corcova tua é impecilho.
A essa “guloseima” diz adeus.

Cuidado! Não tens “onde cair morto”.
Atrás de ti anda um tropel de gente.
Vives em pardieiro e sem conforto,
Mas não sai dessa cabeça demente
que p’ras damas não és pobre, nem torto.


Agostinho Alves Fardilha (o meu pai)
Coimbra

Fotos:internet


 

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