segunda-feira, maio 16, 2011

Momento de poesia com Agostinho Fardilha

António Dinis da Cruz e Silva
(1731 – 1799)

“Nascido em Lisboa, de família humilde, consegue, mesmo assim, as protecções que lhe permitiram seguir estudos secundários no Oratório e cursar a Universidade de Coimbra. A experiência da Lusa Atenas constitui-se, também, em traumatismo para este notável satírico. Mas é este um dos momentos culminantes de ataque ao fradismo mental dos lentes.
Em 1764 encontramo-lo como juiz auditor em Elvas. O “Hissope” é a obra-prima de Cruz e Silva. Ele baseia-se num assunto trivial: a disputa entre o Deão da Sé de Elvas e o Bispo. Quando este visitava a Sé, era costume ser recebido pelo Deão, que lhe fazia a entrega do hissope para as aspersões rituais. Certo dia, o Deão recusa-se a cumprir com esta praxe. E das querelas daí derivadas nasce a matéria para o “Hissope”. Neste poema o que está em questão é todo um mundo ainda eivado de feudalismo, em plena época das Luzes.
O “Hissope” cristaliza a crítica iluminista ao alto clero da terra. É uma sátira social.”

Relembremo-lo com um pequeno poema satírico e humorístico, mas respeitando (excepto na rima e na métrica) a sua intencionalidade e personificação de imagens abstractas (alegorias).





O Turíbulo
I
Pr’as bandas, onde a bela Aurora o Sol beija,
um recanto era, chamado Quimeras:
diferentes costumes e muita Inveja,
todos discutiam por Bagatelas:
a Excelência, da Senhoria,
mesmo de falsa geneologia,
se afastava: então medrava a Discórdia.
A Lisonja tinha agora bom pasto,
à Depêndencia perdeu-se o rasto.

II

No rincão viviam um sábio Arcipreste,
mui versado na “Summa” Teológica,
tudo contestando oposto ao Celeste;
a moda do francês, pr’ele, era alógica;
o Sacristão, devotado tomista,
de hábitos de antigo seminarista,
e o Acólito, de mente brilhante,
que assimilou o ensino de Descartes,
mas espalhou o Ódio em várias partes.

III

Ira e Afronta mal-estar geraram
entre o Acólito e o Sacristão:
ambos o Turíbulo cobiçaram
e queriam segurá-lo na mão,
quando o Predendado lhe punha o incenso.
Um citava a Tradição e o bom senso;
o outro considerava isso trapaça.
Um,  direito medievo invocava;
p’ra o outro, iluminismo tudo inovava.


IV

Ao Clérigo levaram a pendência.
Ambos alegaram os seus argumentos:
p’ra Acólito, Escolástica, falência;
p’r outro, Tomismo, o melhor dos alimentos.
O Arcipestre, douto e prudente, assim
decidiu: algum de Vós viu o fim
da Impaciência e de outras fúrias?
Acalmem-se e reine sempre a Paz.
Alternem o serviço e isso me apraz.

Agostinho Alves Fardilha (o meu pai)
Coimbra

Fotos:internet

11 comentários:

Anónimo disse...

Bela homenagem a um poeta que desconhecia (mea culpa...mea culpa).

Abraço.

AA.

Graça Pereira disse...

Gostei da sátira, com muito oportunismo e humorismo e aqui deixo os meus parabens ao Poeta!
Graça

lis disse...

Muito interessante o poema.
A liturgia com o incenso era prática que mais gostava pra ver o coroinha agitar a fumaça aos céus, em tempo de procissão.Porque nunca foi meus costumes.
Excelente Sr.Agostinho, excelente .
Obrigada pela preciosidade de Antonio Dinis.
abraços aos dois
com carinho

mfc disse...

Os tempos mudaram?!
Nem por isso!
Nos costumes pouco se evolui.

Bergilde disse...

Olá Mona Lisa!
Gosto dessas poesias refinadas que pões aqui.Assim aprendo e conheço mais de ti,da tua história.
Abraços,
*Tive dificuldade em acessar anteriormente os comentarios do blogger.

Anónimo disse...

Parabéns ao poeta por tão soberba homenagem feita a outro poeta.

Abraço.

Lilá(s) disse...

Mais uma vez os parabéns ao Poeta!
E gostei da homenagem apesar de não conhecer gostei de ler.
Bjs

Mariz disse...

E parabéns pela homenagem, de um poeta a outro.

mil beijos...Mariz

Maria Luisa Adães disse...

Parabéns poeta!

Bela sátira!

Abraço,

Mª. Luísa

Emília Pinto disse...

Mais uma vez, Lisa, quero dar os parabéns ao teu pai. Além da bela poesia nos deixa aqui uma bela sátira à igreja daquele tempo. Muito interessante. Gostei muito de ver as fotos da mesquita azul. Saudades daquele passeio!!! Um beijinho, amiga e fica bem!
Emília

Adelaide Mesquita disse...

Olá Elisa!
Dá os meus parabéns ao teu Pai pois consegue superar-se sempre.
Um beijo para ele
Bj
milai

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