quinta-feira, junho 09, 2011

Momento de poesia com Agostinho Fardilha

Domingos dos Reis Quita
(1728-1770)

“ Nasceu em Lisboa em 1728. Filho de um negociante arruinado, teve de seguir o ofício de cabeleireiro, aos 13 anos, para ajudar a sustentar a família. Nos ócios da oficina, tomado de amor pelas letras, lia com entusiasmo, sobretudo Rodrigues Lobo. Começou a ensaiar-se na poesia e adquiriu certa popularidade.
O poeta cabeleireiro frequentava a casa de um amigo, por cuja filha se apaixonou, fazendo dela a sua musa, sob o nome poético de Tirceia. Esta, porém, casou com outro e o pobre Quita desfez-se em poéticas lamentações. O terramoto de 1755 deixou-o sem recursos.  Então Tirceia, já viúva, recolheu-o em sua casa.
Em 1761 Quita tuberculizou. Tirceia, casada segunda vez com um médico, conseguiu que o marido  tratasse da sua cura. Mas o poeta, em 1770, sucumbiu, correndo o rumor que fora o marido quem envenenara o estranho hóspede de sua mulher.
A obra de Quita, vasada nos moldes clássicos, embora ressinta falta de cultura, adquire, por vezes, um tom brando, langoroso e melancólico, que anuncia a nova disposição das almas, que o pré-romantismo dá vida”.

Lembremo-lo com o “idílio”, que se segue.






Idílio

I          
Ó Tágides do rio caudaloso,
ó côncavos rochedos, que guardais
os meus e de Dulcineia meigos ais,
dai-me um coração menos  lutuoso

II

Rústicas e odorantes flores os prados
enfeitam.É a úbere Primavera:
das louçãs pastoras meiga quimera,
pr’os rebanhos pastos de muitos grados.

III

P´ra mim sois desvelo e também receios
d’ela faltar ao combinado encontro.
Vinde depressa assistir ao recontro
dos meus suspiros, lágrimas e anseios.

IV

Algo no meu coração me avisava
que ela algures ficaria retida
e contra sua vontade impedida
de abraçar por quem tanto suspirava.

V

Como as lágrimas dos olhos secar?
Haverá quem suporte esta amargura?
Para a minha dor não encontro cura;
dia p’ra dia aumenta o meu pesar.

VI

Meu amor, o que daria p’ra ver
agora os teus formosos e tristes olhos,
que, de repente, se tornaram abrolhos,
que rasgam a Alma, fazendo-a sofrer?

VII

O pensamento só em ti repousa.
Sou companheiro do céu estrelado;
ainda vivo, mas descontrolado:
não durmo e confortar-me ninguém ousa.

VIII

Soube hoje que teu par noivo arranjou
p’ra ti. Mas as nossas juras de amor
não são perenes? Sofres e a minha dor
p’ro corpo a sepultura já cavou.

IX

Choro quando recordo de, ao sol posto,
ver-te sentada na areia, brincando,
e com a espuma da água molhando,
rindo-te, esse teu belo e alvo rosto.

X

Disseram-me que já enviovaste
e que outro marido, rico, já tens.
Não foste leal, mas presa manténs
quem ainda te ama, e atraiçoaste.

XI

No corpo habita doença mortal.
Meu pecado foi entregar-me a ti.
Valeu a pena pelo que senti!
Sê feliz; perdoo-te todo o mal.


Vocabulário:
lutuoso = triste
grado = gosto
recontro = peleja
abrolho = espinho

Agostinho Alves Fardilha( o meu pai)
Coimbra
 Foto:internet 

8 comentários:

Bergilde disse...

Mona Lisa,
Os textos e poesias de seu querido pai são uma grande riqueza literária e cultura...
Por outro lado,estava olhando sua slide bar e chamou também minha atenção as fotografias(muito curadas e bonitas,parabéns por tudo!

Maria Luisa Adães disse...

Grande ausência minha.
pc com grandes problemas por agora sanados e depois me ausentei.

Lindos esses poemas de seu querido pai.

Obrigada pelos auxilios que me tentou prestar.

Um abraço,

Maria luísa

mfc disse...

Um começo seguindo as pisadas de Camões na evocação das Tágides!
Uma trama datada e asceticamente poética!

Lilá(s) disse...

Que maravilhoso é este poeta!
Beijinhos aos dois

Anita de Castro disse...

Que palavras lindas de se lêr ,um grande beijinho para ti e teus pais

Nilson Barcelli disse...

Não conhecia o poeta, mas o texto explica tudo...
Amiga, desejo-te um óptimo fim de semana.
Beijos.

Rita disse...

Mais um momento poético muito bonito.
Bj ao pai poeta e à filha babada!

Mar Arável disse...

Tudo muito belo

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